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Ministério da Saúde contrata grupo empresarial investigado por fake news para monitorar covid-19

“Tudo isso aliado a um custo por minuto muito elevado”, destaca a ação do MP-SP, que classificou a atração como uma mistura de “jogo de azar com publicidade enganosa”. O programa estimulava o uso do código de operadora da IPCorp, cujo valor por minuto chegava a ser seis vezes superior ao das concorrentes. 

Um software semelhante faz as ligações do TeleSUS, com perguntas preestabelecidas pelo Ministério da Saúde a respeito do estado de saúde das pessoas. “Fizemos um algoritmo que faz disparo de ligações para 125 milhões de brasileiros. Esses disparos estão ligados em um grande data center, que irá nos ajudar a antecipar o nome das pessoas, onde elas estão, se são grupo de risco, com quem convivem. É como se fosse uma consulta, por meio de uma voz artificial, que vai fazer uma triagem”, afirmou em 31 de março o então ministro Luiz Henrique Mandetta sobre a ligação gratuita do governo, cujo número que aparece no identificador é o 136.

Até o momento, 11 milhões de pessoas já passaram pela triagem, das quais 686 mil estão sendo monitoradas. “O serviço viabiliza a implantação de estratégias automatizadas, como a busca ativa para identificar antecipadamente pessoas vulneráveis com sinais de covid-19, através do disparo de ligações com atendimento automatizado para encontrar possíveis casos e monitoramento à distância das pessoas em isolamento”, informou o ministério à Repórter Brasil.

Marketing negativo e má gestão

Os problemas relacionados ao grupo IPCorp não se resumem a práticas de exploração de consumidores na TV. O software de pesquisa por telefone desenvolvido pela IPCorp também foi utilizado nas campanhas eleitorais de 2012 e 2014 para espalhar notícias falsas sobre candidatos do PP, PRB e PT. Em 2012, o TRE-RJ identificou 50 mil ligações com notícias falsas no dia da votação para eleitores de Itaboraí, na região metropolitana do Rio de Janeiro. O tribunal chegou a cassar o prefeito eleito, que se manteve no cargo por decisões liminares de tribunais superiores. 

Já na campanha de 2014 ao governo estadual do Rio, os então candidatos Marcelo Crivella (PRB) e Lindbergh Farias (PT) denunciaram os dois sócios da IPCorp ao TRE por realizar marketing negativo contra suas candidaturas e em favor de Luiz Fernando Pezão (MDB), eleito na ocasião. O TRE absolveu no ano passado o ex-governador e os sócios da empresa.

Além disso, em março, a própria Talktelecom não teve renovado o contrato com o governo do Rio de Janeiro para gerir o software de gestão de crédito consignado. Segundo a Casa Civil do estado, a empresa “não atendeu às demandas do serviço de forma satisfatória” e deixou de cumprir “inúmeros” termos do contrato.

Cerca de 11 milhões de pessoas já foram contatadas pelo TeleSUS; 686 mil são atualmente monitoradas pelo Ministério da Saúde (Foto: Engin Akyurt/Unsplash)

Apesar do histórico, as empresas não são impedidas de contratar com o poder público. A Talktelecom diz que sua área de atuação é distinta à da IPCorp, embora ambas pertençam ao mesmo grupo. Afirma também que as multas do Procon-SP são “irrisórias” e que as sanções da Anatel são questionadas na Justiça. Com relação às denúncias de ataques eleitorais, a empresa diz que não foi considerada culpada pelo TRE-RJ. E sobre a investigação do MP-SP, diz que “a Falkland foi mencionada na ação porque as linhas da operadora foram contratadas e utilizadas por clientes” e que “não tem conhecimento ou interferência sobre o conteúdo das chamadas”. (Leia na íntegra os posicionamentos do Ministério da Saúde e da Talktelecom).

Falta de transparência

Além das contratações sem licitação, outro problema apontado por especialistas é a falta de uma base de dados unificada com todos os gastos do Ministério da Saúde. O painel de compras do governo federal informa gastos de R$ 219 milhões em compras sem licitação. A própria pasta, no entanto, detalha que as aquisições desse tipo já passam de R$ 2,7 bilhões. Já o Tesouro Nacional, que lançou na semana passada um site para divulgação dos dados, aponta que o ministério já gastou mais de R$ 5,2 bilhões na pandemia.

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