Enquanto Brasil debate isenção de agrotóxicos, Europa tem imposto maior para os mais tóxicos
A Medida Provisória proposta pelo governador Carlos Moisés (PSL) levou o nome de “Tributação Verde” e tinha como objetivo regular a cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) estadual a partir do grau de toxicidade do agrotóxico.
A MP previa faixas diferentes de cobrança, começando pelos produtos biológicos, que seriam isentos da tributação. Os improváveis de causar dano agudo teriam alíquota de 4,8% do ICMS, os de pouca toxicidade 7%, moderadamente tóxicos 12% e altamente ou extremamente tóxicos pagariam 17%. Essa classificação é feita pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) durante o processo de registro do produto.
A parte da MP que visava implantar a tributação verde foi barrada ainda na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do legislativo catarinense em setembro do ano passado. Na visão do relator, Romildo Titon (MDB), e dos demais deputados estaduais, não havia urgência na definição da tabela de cobrança do imposto por toxicidade do agrotóxico. “Mesmo não sendo aprovado, em um primeiro momento, temos que ressaltar a importância da discussão sobre os agrotóxicos. Sabemos que, por ser um tema delicado, ainda teremos muitos debates pela frente”, afirmou o governador de Santa Catarina, Carlos Moisés, à reportagem.
De acordo com o estudo da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco), feito por pesquisadores da Fiocruz e da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), dos quase R$ 10 bilhões perdidos em 2017 pelo governo com as isenções fiscais, R$ 6,2 bilhões são desonerações com ICMS que iriam para o cofre dos Estados e do Distrito Federal.
Apenas em Santa Catarina, as desonerações foram de R$ 171 milhões em apenas um ano. O valor é seis vezes maior do que o governo de SC pretendia investir no programa de Agricultura Familiar (R$ 25,5 milhões) em 2019, de acordo com o Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA).
Sobre o projeto, o governador diz que o objetivo era promover a saúde pública, a preservação ambiental, e agregar valor ao produto catarinense. “É uma política de Estado inovadora que favorece a produção de alimentos mais saudáveis e auxilia no desenvolvimento de uma cultura econômica sustentável”, explicou.
Benefício no ICMS pode cair em todo país
Mas a assembleia dificilmente vai conseguir segurar essa mudança no estado. A ação que o STF julga hoje busca derrubar o benefício que reduz a base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) de agrotóxicos nas saídas interestaduais, além da isenção total de IPI. Mas outra votação deve chacoalhar o mercado de agrotóxicos em abril.
É quando o Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) vota sobre a renovação do convênio que permite aos estados concederem isenção e reduzir a base de cálculo ICMS aos agrotóxicos.
Para que os benefícios se mantenham, é necessário unanimidade entre todos secretários estaduais de Fazenda. Se um membro do conselho se posicionar contra, o convênio não é renovado e as empresas podem perder a isenção. O secretário de Fazenda de Santa Catarina, Paulo Eli, já garantiu que vetará a renovação do convênio.
“Ano que vem será o ano da retirada nacional da isenção do agrotóxico, pois Santa Catarina vai votar contra no Confaz na prorrogação desses benefícios. Já é uma decisão tomada, então, a partir de 1º de maio do ano que vem, agrotóxico no país vai pagar imposto e isso vale para todos”, disse o Secretário em audiência na assembleia estadual em junho do ano passado.
Além do ICMS, o “pacote de benefícios” conta com privilégios na cobrança de outros impostos. Desde 2004, a Lei Federal 10.925 prevê a isenção do pagamento de tributos como o PIS/PASEP e do Cofins na importação e sobre a receita bruta de venda no mercado interno. E, devido ao Decreto 7.660, de 23 de dezembro de 2011 os agrotóxicos têm isenção total de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
Exemplo seguido no Espírito Santo
O Ministério Público do Espírito Santo estuda um projeto semelhante ao de Santa Catarina. No ano passado, órgãos de defesa do consumidor se inspiraram na Tributação Verde e estão construindo um projeto semelhante liderado pelo Fórum Espírito-Santense de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos.
O projeto pretende regular a cobrança do ICMS a partir do grau de toxicidade do agrotóxico, com as mesmas alíquotas do projeto de Santa Catarina. “O debate ainda está em fase inicial. Acompanhamos os diálogos proposto nos demais fóruns estaduais, inclusive de SC, e estamos apresentando o projeto para as secretarias de Agricultura e Fazenda. Queremos levar também o projeto para os deputados estaduais”, conta a promotora Sandra Lengruber, coordenadora do Fórum.