Política

Crise Irã-EUA: Quais os impactos políticos da morte de Qassem Soleimani?

SÃO PAULO – O ataque realizado pelos Estados Unidos contra um aeroporto de Bagdá, capital do Iraque, que culminou na morte do principal líder militar iraniano, o general Qassem Soleimani, ganhou repercussão mundial e trouxe novamente à tona um sentimento de preocupação com os riscos de uma escalada de conflitos internacionais para o ano que acaba de iniciar.

Considerado um herói nacional no Irã, Soleimani liderava há mais de 20 anos a força Quds, braço de elite da Guarda Revolucionária do país, responsável pelo serviço de inteligência e por conduzir as principais operações militares secretas no exterior. Ele era visto como uma das pessoas mais poderosas do país e um dos nomes cotados para suceder o aiatolá Ali Khamenei — líder supremo de 80 anos.

A operação, realizada a partir de um drone na madrugada de sexta-feira (3) em horário local, foi autorizada pessoalmente pelo presidente Donald Trump, de acordo com o exército norte-americano. “O general Soleimani estava desenvolvendo planos de atacar diplomatas americanos e militares a serviço no Iraque e em toda a região”, dizia um comunicado emitido pelo Pentágono. A alegação é que a ação foi uma forma de “dissuadir” futuros ataques iranianos.

“General Qassem Soleimani matou ou feriu gravemente milhares de americanos durante um longo período e planejava matar muitos outros… Mas foi pego! Ele foi direta e indiretamente responsável pela morte de milhões de pessoas, incluindo o recente alto número de manifestantes mortos no Irã”, disse Trump por meio de sua conta oficial no Twitter.

Embora o Irã nunca seja capaz de admitir propriamente, Soleimani era odiado e temido no país. Eles não estão tão tristes quanto os líderes tentarão fazer o resto do mundo acreditar. Ele deveria ter sido eliminado muitos anos atrás”, complementou.

No Irã, o governo convocou uma reunião de emergência de sua cúpula de segurança para avaliar uma resposta ao ataque e já promete “uma vingança severa”, nas palavras do líder supremo do país, o aiatolá Ali Khamenei. Para muitos, o assassinato de uma figura do calibre de Soleimani funciona praticamente como uma declaração de guerra dos americanos contra os iranianos.

O general Soleimani era apontado como uma espécie de ministro de Relações Exteriores do governo iraniano, responsável por operações fora do país e articulações como as realizadas com o Hezbollah, no Líbano, a organização islâmica Hamas, e mais recentemente forças houthis do Iêmen. Ao longo dos anos, a Guarda Revolucionária do Irã funcionou como braço armado que garantia o regime internamente e instrumento para o embate indireto com os EUA na região.

O episódio ocorre em meio a uma nova escalada de tensão nas relações entre o governo Donald Trump com o país persa, após a morte de um funcionário terceirizado do Exército americano em um ataque contra uma base do país próxima a Kirkuk e depois de tentativas de invasão de parte do complexo onde fica a embaixada dos EUA em Bagdá, na última terça-feira (31), por integrantes de milícias iraquianas. Mas as razões que levaram os americanos a realizarem o ataque justamente neste momento ainda levantam dúvidas.

O ataque atinge o regime iraniano em um momento de fragilidade do país, em função das sanções impostas por Washington após a saída do acordo nuclear firmado durante a gestão de Barack Obama, que têm provocado incômodo na população e fortes impactos econômicos. Mas a ação pode ter efeitos colaterais para um governo que tentava enfraquecer o atual regime iraniano.

“Não vão dizer que esse ataque veio em boa hora. Mas ele ocorre após uma grande onda de protestos no Irã, com diversos presos e mortos. O país não havia se recuperado economicamente com a entrada de Trump e piorou muito depois das sanções financeiras. Agora praticamente ninguém vai protestar contra o governo após essa ação. Na prática, há um fortalecimento do regime que Trump queria derrubar. É um tiro pela culatra”, observa Gunther Rudzit, professor do curso de Relações Internacionais da ESPM e especialista na área de Segurança Internacional.

A ofensiva norte-americana também amplia a pressão por uma resposta à altura pelo governo do país persa. Nas redes sociais, os termos “Trump”, “Iran”, “World War 3” e “WWIII” figuravam entre os mais comentados pelos internautas. As reações também são de preocupação no mercado financeiro, com disparada do petróleo, alta do ouro e recuo das bolsas mundiais. Uma escalada nas tensões pode ter efeitos severos sobre a economia global.

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