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Com esquizofrenia e epilepsia, agricultor mostra evidências sobre o efeito de agrotóxico em sua saúde

A conta das doenças 

Após o primeiro diagnóstico, em 1997, Sebastião deixou a família no interior e foi morar com uma tia em Vitória. “Nunca mais voltei para a roça”, lamenta. Meses depois ele vendeu o sítio e toda família se mudou para a capital. 

Apenas em 2000 Sebastião conseguiu aposentar por invalidez. Hoje, recebe um salário mínimo, mas gasta quase a metade, cerca de R$ 450, apenas com medicamentos. “Tomo remédios para diminuir as dores que sinto. Tenho insônia, então preciso de comprimidos para dormir. Além do medicamento para diabete e os problemas na cabeça”, diz.

O pequeno agricultor alega ter mais de 50 laudos médicos que apontam a intoxicação por Round Up (Ilustração: Guilherme Peters/Agência Pública)

A filha do aposentado, Suelly da Silva, acompanha de perto a luta do pai. “Desde a primeira ida ao hospital, lá em 97, o médico disse que as doenças eram consequências do agrotóxico que ele mexeu. E aí vem aparecendo problemas novos, agora os dedos do pé dele não estão movimentando mais”, conta. 

Em 2005, Sebastião ajuizou ação de indenização de responsabilidade civil por dano material e moral contra a Monsanto, sob o argumento de que o manuseio do herbicida Roundup em sua lavoura foi a causa de uma série de problemas de saúde, que culminou com a concessão de aposentadoria por invalidez. “Demorei muito para me recuperar a ponto de pensar no processo”, explica ele. 

A decisão saiu quatro anos depois. O juiz Abgar Torres Paraíso, da 11ª Vara Especializado em Defesa do Consumidor julgou parcialmente procedente a denúncia e condenou a Monsanto a pagar ao agricultor R$ 250 mil como indenização por danos morais, uma pensão mensal e vitalícia no mesmo valor pago pela Previdência Social, além de um valor mensal de R$ 139,49 cobrado de novembro de 1997 até a data da decisão, em 2009, totalizando cerca de R$ 23 mil. 

O valor da indenização foi baseado na multa mais alta aplicada pelo STJ até então, no valor de R$ 360 mil em um caso onde a vítima havia ficado em estado vegetativo por erro um erro médico. Com base nesse valor, o juiz estipulou o valor indenizatório para o agricultor que ficou com incapacidade total.

A empresa recorreu a decisão. Na segunda instância, além de argumentar que as provas apresentadas demonstram “de forma inequívoca a inexistência” o nexo causal entre as doenças e o agrotóxico, a defesa apelou pelo prazo de prescrição para a denúncia. De acordo com o artigo Art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, o pedido de reparação pelos danos causados por um produto prescreve em cinco anos, sendo que a contagem passa a valer no momento em que o dano é conhecido.

A defesa de Sebastião alega que o prazo de conhecimento do dano deveria ser contado a partir de 23 de fevereiro de 2002, data em que o neurocirurgião Fred Tannure emitiu laudo definitivo acerca de sua invalidez permanente. 

O Tribunal capixaba avaliou o que o prazo prescricional iniciou-se quando Sebastião passou a sofrer com os problemas de saúde. “O apelado tinha ciência inequívoca de seus problemas de saúde desde o ano de 1997, quando foi internado com suposto quadro de intoxicação aguda por agrotóxicos, apresentando crise convulsiva e distúrbio mental, como se extrai dos atestados médicos juntados aos autos, inclusive do laudo datado de 23.02.2002, circunstância que, segundo o próprio apelado, o levou a abandonar, naquele mesmo ano (1997), o trabalho rural”, diz a decisão. 

Sebastião, então, recorreu e, em 2015, o relator da ação no Supremo Tribunal de Justiça (STJ), ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, votou contra o agricultor, seguindo o entendimento do Tribunal do Espírito Santo. “Os argumentos expendidos nas razões do regimental são insuficientes para autorizar a reforma da decisão agravada, de modo que esta merece ser mantida por seus próprios fundamentos”, afirmou na decisão. Os ministros Marco Buzzi, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha, Raul Araújo, Paulo de Tarso Sanseverino, Maria Isabel Gallotti e Antonio Carlos Ferreira votaram com o relator, e por unanimidade a seção decidiu por arquivar o processo. 

Sebastião lamenta: “Receber a indenização me ajudaria a pagar o tratamento de remédios que estou tomando. Queria que algum advogado pudesse me ajudar”. 

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