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Com esquizofrenia e epilepsia, agricultor mostra evidências sobre o efeito de agrotóxico em sua saúde

Depois de passar cinco anos aplicando o glifosato em sua pequena lavoura de café, o agricultor Sebastião Bernardo da Silva desenvolveu um quadro de epilepsia e esquizofrenia que, segundo perícias feitas por um neurocirurgião, foi consequência à exposição ao agrotóxico. Com laudos médicos atestando que suas doenças eram sequelas da intoxicação, o pequeno agricultor obteve uma rara conquista judicial contra a gigante Monsanto em 2009. Mas sua vitória durou pouco. A empresa recorreu e ganhou em segunda e em terceira instância com argumento de que o caso estava prescrito.

Hoje, aos 68 anos de idade, Sebastião mora em Vitória, capital do Espírito Santo, longe das terras que cultivou durante quatro décadas. Aposentado e sofrendo com um delicado quadro de saúde, ele manda um recado para outros produtores que seguem aplicando o glifosato: “Não usaria de novo nem que me pagassem. Quando não mata a pessoa na hora, ele mata aos poucos”, afirma. 

Sebastião lamenta a decisão judicial por alegar a prescrição do caso: “Receber a indenização me ajudaria a pagar o tratamento de remédios que estou tomando” (Foto: Arquivo pessoal)

Tudo começou em 1992, quando ele buscava melhorar o resultado da plantação de café do seu sítio, de cerca de três alqueires de terra em Boa Esperança. Foi quando começou a usar o herbicida Round Up, produto da multinacional Bayer/Monsanto que tem como base o glifosato. De fato, o produto melhorou a produtividade da lavoura, mas aos poucos derrubou a saúde do agricultor. 

Em 1997 veio o primeiro baque.  “Estava um dia na roça e comecei a me sentir mal. A cabeça doía muito. Desmaiei, fiquei inconsciente e minha esposa me levou ao médico”, relembra Sebastião. 

Ele passou 12 dias internado em um hospital em Vitória até receber o primeiro diagnóstico: esquizofrenia e epilepsia. Teria que deixar a fazenda e mudar-se para a capital para iniciar o tratamento. “Fiquei desesperado, toda renda da minha família vinha da roça”, conta. 

O diagnóstico chegou cinco anos após ter ele contato com o herbicida da Monsanto pela primeira vez. Desde então, a saúde só piorou: depressão, pressão alta, diabetes, glaucoma, artrose e alterações no sistema nervoso estiveram entre os diagnósticos. “Foram idas e vindas ao hospital, vários médico e psiquiatras, e tudo só piorava. Os médicos disseram que era consequência do contato com agrotóxicos”, diz.

Sebastião, que é casado e tem quatro filhos, diz ter mais de 50 laudos médicos que apontam a intoxicação por Round Up. 

Comprovação médica

A reportagem teve acesso a dez desses laudos médicos, sendo que oito deles estão transcritos na decisão da ação no STJ. O primeiro data de julho de 1997. O médico que acompanhou o caso, o neurocirurgião Fred Tannure, identifica um quadro de “intoxicação aguda por agrotóxicos, apresentando crise convulsiva g.mal (grave) e distúrbio mental”. 

Dois meses depois, outro laudo do mesmo médico atesta um “quadro de epilepsia temporal e distúrbio do comportamento que o impede (o agricultor) de exercer atividades de profissão e de negócios temporariamente”. 

Em 1992, Sebastião tentou melhorar o resultado de sua plantação usando o herbicida Round Up, que tem como base o glifosato. O produto melhorou a produtividade da lavoura, mas aos poucos derrubou a saúde do agricultor (Ilustração: Guilherme Peters/Agência Pública)

Em laudo de três anos depois, em 2000, Tannure escreve que os quadros de esquizofrenia e epilepsia temporal tornavam Sebastião incapaz em caráter permanente. Em 2002, mais um laudo do neurocirurgião atesta que o agricultor estava há cinco anos em tratamento neurológico e o encaminha para a psiquiatra “por apresentar invalidez permanente por acidente de trabalho, ocorrido pelo manuseio de agrotóxico do tipo Roundup, aplicado na sua lavoura para eliminação de ervas daninhas, o que lhe causou sequelas físicas e mentais”. 

Outro exame, feito em 2008, ainda encontrou resíduos do agrotóxico no sangue de Sebastião, 11 anos após ele parar de utilizar o herbicida. 

“Decidi guardar todos os remédios que eu tomava, já são mais de 100 mil comprimidos”, conta. Ele apresenta o saco onde guarda as embalagens, com mais de um metro de altura, como prova das consequências dos agrotóxicos em sua vida. Entre os medicamentos encontram-se o Rivotril (antidepressivo e ansiolítico), o Lodipil (hipertensão), Pamelor (antidepressivo) e o Tegretol (epilepsia e dor neuropática). 

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