Usina que deu calote trabalhista tenta retomar terra ocupada por ex-funcionários há 20 anos
Em 2011, o então vereador Camilo de Lelis Fernandes (PCdoB) disse ter sido ameaçado por Jovane Junior e dois de seus comparsas. Armado, ele teria entrado na frente do carro do vereador e dito: “você vai morrer agora porque o seu povo invadiu a usina do meu pai”. À época, um grupo do MST havia ocupado a sede da fazenda para pressionar por uma resolução da disputa pela área.
“O Jovane não tem nem arma na casa dele. Aliás, se tivesse esse perfil, certamente essas pessoas já teriam sido alvejadas. Ao contrário, ele sempre buscou o caminho certo, da Justiça”, contesta o advogado.
Avanço do agronegócio
O principal argumento da família de Jovane para o pedido de urgência de despejo das famílias da área é um contrato firmado há dois anos com a empresa Jodil Agropecuária e Participações Ltda., cujo proprietário é João Faria da Silva, que já foi chamado de “maior produtor e exportador individual de café do país” por publicações especializadas. Entre os principais compradores dos produtos do empresário estão a Nestlé e a holandesa Jacobs Douwe Egberts, dona das marcas Pilão, Café do Ponto, Cacique, Café Pelé e Damasco.
‘Tenho medo, porque a gente que é pobre não pode perder isso daqui’, diz Francisco Luiz Meireles, 67, sobre as terras em que vive há 20 anos
A ofensiva do grupo começou em 2015, um ano antes, quando o Governo de Minas publicou um decreto de desapropriação da área da antiga usina para que ela fosse destinada à reforma agrária. Apesar de o acordo ter sido fechado com o síndico da massa falida, Jovane Moreira questionou na Justiça a validade do documento. O decreto acabou suspenso e aguarda julgamento de recurso pelo Tribunal de Justiça.

“Se acontecer isso [o despejo], é um sonho que morreu”, diz, apreensivo, Sebastião da Silva. (Foto: Caio Castor)
Jovane começou então uma corrida para pedir a recuperação judicial da companhia. O acordo com João Faria permitiu que ele quitasse em 2017 as dívidas com os trabalhadores que haviam entrado na Justiça. O empresário também quitou os débitos municipais e estaduais. Há, porém, uma dívida de quase R$ 400 milhões com a União, referentes à contribuições previdenciárias, FGTS e impostos federais, que foi negociada e parcelada por meio do Refis, programa do governo que facilita o refinanciamento de dívidas.
O documento firmado prevê o arrendamento de parte dos 4 mil hectares da terra para o plantio de café, enquanto outra parcela seria destinada ao cultivo da cana-de-açúcar. A empresa diz que o acordo vai gerar de 300 a 400 empregos diretos na propriedade. O argumento funcionou e, na decisão do último dia 7, o juiz justifica a retirada das famílias por conta do “rentável contrato de arrendamento rural”.
Distantes da sala do magistrado, as famílias aguardam com esperança uma suspensão da ordem de despejo. “Tenho medo, porque a gente que é pobre não pode perder isso daqui”, diz Francisco Luiz Meireles, 67, que trabalhou desde os 8 anos de idade em fazendas da região.
“Se eu for para a cidade eu morro logo, a minha natureza é trabalhar na terra. Quem é nascido e criado na roça não serve para a cidade não”, diz o agricultor, que não tem filhos e mora com a esposa em um dos lotes prometidos a João Faria.
Esta reportagem foi realizada com o apoio da DGB Bildungswerk
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Fonte: Reporter Brasil