Economia

Um ano após a tragédia de Brumadinho, sustentabilidade ainda não é prioridade em alocações

O gestor cita a Amazônia como exemplo. “Quando o tema desmatamento da Amazônia ganhou relevância, a Vale não se posicionou sobre as solicitações de exploração mineral que ela tem na região. Ela não retirou nenhuma delas. Patrocinar eventos e fazer campanhas é a parte mais fácil da política de sustentabilidade. Agora, abrir mão de projetos é outra história.”

Para Alperowitch, a falta de produtos na prateleira de investimentos sustentáveis prejudica o processo de conscientização. “No mundo inteiro tem gente que topa qualquer coisa: se polui, polui, se mata, mata. Existem, sempre vão existir. Outros investidores já têm outro perfil. Alguns que investiam na Vale deixaram de investir. O possuidor final de recursos tem uma preocupação cada vez maior com onde ele está colocando o dinheiro. Esse debate está chegando ao Brasil agora, a uma velocidade crescente.”

“Existem opções de empresas com boas práticas sustentáveis, mas o investidor tem que procurar. O maior acesso à informação tem ajudado nisso”, completou. Entre os exemplos citados pelo gestor estão Klabin, Arezzo, Localiza, MRV, Fleury, Duratex e Raia Drogasil.

Estrangeiros na frente

Enquanto no Brasil o tema sustentabilidade ainda não é prioridade para a maioria dos gestores, no exterior grandes investidores já têm demonstrado que não vão tolerar práticas não sustentáveis das empresas em que investem.

Nesta semana foi colocado no ar um site da Iniciativa por Segurança em Mineração e Barragens (Investor Mining and Tailings Safety Initiative), liderado pela Church of England, fundo de pensão dos párocos britânicos, que representa 110 instituições que gerem mais de US$ 14 trilhões juntos.

A ideia é cobrar de mineradoras globais informações periódicas sobre suas barragens para averiguar os riscos e os problemas que devem ser resolvidos, a fim de evitar tragédias como a que aconteceu em Brumadinho. Os relatórios estão disponíveis online.

A Church of England se desfez de suas ações da Vale no ano passado por causa do desastre em Minas Gerais e decidiu, então, engrossar o estímulo aos investidores para que eles cobrem cada vez mais transparência e segurança das empresas mineradoras.

Também nesta semana, a agência de classificação de risco Fitch Ratings soltou uma nota em que reafirmou a relevância das questões ambientais, sociais e de governança (ESG) para as empresas da América Latina.

“As significativas deficiências nas questões de ESG, particularmente em termos de governança, são ou foram um empecilho para os perfis de crédito da Vale e de vários outros emissores latino-americanos, incluindo JBS S.A. (JBS), Eldorado Brasil Celulose S.A. (Eldorado) e Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobras)”, disse.

“A administração e a governança corporativa são fatores que a Fitch observa ao avaliar os perfis de negócios das empresas. (…) O rating grau de investimento da Vale continua apoiado em sua forte capacidade de pagamento de dívidas diante de um preço favorável do minério de ferro, acima de US$ 90/tonelada, e na gestão proativa de sua estrutura de capital, apesar dos contratempos em termos de ESG.”

A agência destacou que a demanda dos investidores pela Vale permaneceu robusta, mesmo com os fatores negativos de ESG. “De acordo com as projeções da Fitch, a dívida líquida da empresa deve se aproximar de US$ 5 bilhões no final de 2019, e o índice dívida líquida/EBITDA estava abaixo de 0,5 vez, apesar dos obstáculos legais e operacionais resultantes do colapso da barragem de rejeitos no primeiro trimestre de 2019.”

A Fitch afirmou ainda que, no entanto, o rating da Vale é limitado pelos problemas relativos à governança e ao bem-estar dos funcionários. “Considerações ambientais relacionadas a resíduos e materiais tóxicos são fatores que afetam o perfil de crédito da Vale, que recebe scores mais baixos, devido às acusações que pesam sobre a companhia e alguns de seus funcionários.”

Quem também se posicionou nesta semana foi a BlackRock. A gestora global, responsável por investir US$ 7 trilhões, divulgou uma carta de seu presidente, Larry Fink, com uma mensagem bem clara: a sustentabilidade e as mudanças climáticas estão remodelando as finanças e investimentos.

No documento, ele cita que as alterações climáticas tornaram-se um fator decisivo nas perspectivas das empresas a longo prazo e que os investidores estão cada vez mais reconhecendo que o risco climático é um risco de investimento. “Veremos uma reavaliação profunda do risco e do valor dos ativos. Estamos à beira de uma significativa realocação de capital.”

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