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Sucessão de falhas, omissão e jogo de empurra deixam população no escuro sobre presença de agrotóxicos na água

Mas a Vigilância Municipal não apresentou os laudos das coletas de pontos de sua responsabilidade que mostravam água contaminada, como uma realizada em dezembro de 2017 no Instituto Lauro de Souza Lima, em que o agrotóxico Clorpirifós, cujo valor máximo permitido é de 30µg/L (micrograma por litro), mostrava um resultado de 5.000µg/L, um índice que, se fosse verdadeiro, ofereceria riscos imediatos à população de Bauru. 

Quem, então, deveria vigiar a Vigilância, que não percebeu o problema ou percebeu e não foi atrás? Em qual setor das esferas públicas deveria acender um alerta para checar se esses dados altíssimos seriam erros de digitação ou se, de fato, a água estava com alto grau de contaminação? 

A resposta passa pela Secretaria Estadual já que, segundo a portaria do Ministério da Saúde sobre tema, “compete às Secretarias de Saúde do Estados promover e acompanhar a vigilância da qualidade da água, em articulação com os Municípios e com os responsáveis pelo controle da qualidade da água”. 

Em nota, a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo informou que “a responsabilidade de investigação e análise da qualidade da água é do município e das empresas responsáveis pelo abastecimento. O Estado capacita e orienta as vigilâncias municipais para que a análise de dados seja feita de forma correta.” 

Metodologia fora do padrão

Um terceiro grande problema ficou visível quando a publicação do mapa abriu a “caixa-preta” dos agrotóxicos na água: nem todas as empresas seguem corretamente as orientações do Ministério da Saúde para lançar os resultados no sistema.

Um dos pontos mais delicados foi esclarecido após a divulgação da reportagem, quando algumas empresas de abastecimento reclamaram que estaria errada a interpretação feita pela reportagem – que se baseou na orientação do Ministério da Saúde. O ponto em questão era a leitura de dois códigos: o Limite de Quantificação e o Limite de Detecção. Foram tantos os questionamentos enviados pelas empresas em decorrência da publicação do mapa que, em junho, o Ministério da Saúde convocou uma reunião técnica com representantes das empresas de abastecimento, do Inmetro, dos laboratórios de saúde pública, das Secretarias de Saúde e da Anvisa para elucidar a metodologia para leitura dos dados.

Algumas empresas alegavam que ao declarar o código “Menor que o Limite de Quantificação” estavam comunicando que não foi possível detectar agrotóxico na água. Mas, segundo Thaís Araújo Cavendish, coordenadora-geral de Vigilância em Saúde Ambiental, o ministério esclareceu que esse resultado na verdade significa que  agrotóxicos foram identificados na água, mas em concentrações tão baixas que não puderam ser quantificadas. 

Nem todas as empresas de abastecimento seguiam as orientações do Ministério da Saúde para lançar os resultados no sistema (Foto: Luiz Winter/GERJ/Divulgação)

Pode parecer uma conversa técnica de químicos, mas a compreensão correta da metodologia é fundamental para que o sistema de vigilância funcione para monitorar e garantir a qualidade da água. 

Agora, com a esclarecimento da metodologia por parte do Ministério da Saúde, as empresas ou órgãos públicos que interpretavam errado precisarão corrigir os dados daqui para frente e também retroativamente. A pasta informou que deu até o fim deste mês (outubro) para essa correção acontecer.

Lista dos 27 ampliada?


Outra crítica feita ao sistema é a de que os testes buscam apenas 27 ingredientes ativos de agrotóxicos – somente em 2019, o governo aprovou a comercialização de mais de 400 novos produtos agrotóxicos. “É preciso que haja um monitoramento mais amplo, até para se verificar de fato que tipo de agrotóxicos está sendo usado em determinada região”, completa a professora Gisela Umbuzeiro, da Unicamp.

O Ministério da Saúde estuda aumentar o número de ingredientes que precisam ser testados e os valores de referência. Mas, além da lista mínima fixada em âmbito federal, cada estado deve editar normas complementares à norma nacional a fim de atender às especificidades de seus territórios. Um exemplo é a norma editada pelo Rio Grande do Sul, que estabeleceu a obrigatoriedade do monitoramento de agrotóxicos que não constam na lista nacional, mas que são muito usados nas lavouras gaúchas. Atualmente, o estado testa, além dos 27 exigidos por lei, outros 46 pesticidas na água. 

Especialistas apontam ainda outros problemas que comprometem a credibilidade dos dados armazenados no Sisagua, como a falta de verificação dos dados fornecidos pelas empresas de abastecimento, que podem ser inseridos pelas próprias empresas.

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