O que estas quatro gestoras esperam dos juros no Brasil
Texto originalmente enviado aos assinantes da newsletter do Stock Pickers em 10 de outubro de 2020. Para receber, clique aqui.
O Brasil de julho de 2015 era muito diferente do Brasil de 2020. Naquela época o Uber ainda era novidade no país, as livrarias estavam lotadas de livros de colorir, a Vale ainda não tinha nenhum rompimento de barragem no currículo e o São Paulo Futebol Clube havia conquistado um título apenas três anos antes.
Mas outra diferença, ainda que imaterial, é talvez a mais importante para dividir esses dois Brasis: a taxa básica de juros.
29 de julho de 2015 foi a última vez que a taxa Selic subiu: de 13,75% ao ano para 14,25% ao ano — valores que, aos olhos de hoje, parecem selvagens.
Desde então a taxa apenas foi mantida, (às vezes por longos períodos, como no patamar dos 14,25%, em 2016 e no de 6,5%, em 2018), ou caiu, até chegar nos atuais 2% ao ano, em 5 de agosto de 2020.
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O que aconteceu desde então? Como você certamente se lembra, o Brasil, em 2015, vivia a administração de Dilma Rousseff. Era época de altos gastos, que levaram o país a perder o grau de investimento, passar por dois anos de recessão e chegar a 14,2 milhões de desempregados.
No ano seguinte, sem Dilma, o Brasil colocou um teto de gastos sobre o governo, e segurou a inflação. Chegamos, assim, ao patamar de juros “civilizados”, semelhantes ao dos países desenvolvidos.
Novo normal?
Na semana passada o Brasil deu amostras de que o passado de gastos desenfreados talvez não esteja tão longe assim.
Bastou o governo pensar expandir o Bolsa Família driblando o teto de gastos e postergando precatórios, para que o dólar subisse, a bolsa afundasse e as taxas da dívida do governo (os títulos do Tesouro) disparassem.
Agora, portanto, analistas e gestores precisam encarar a pergunta: os juros baixos são o novo normal ou ainda corremos o risco de descontrole de gastos, inflação e juros altos?
Abaixo vamos mostrar as visões de quatro casas diferentes, duas que seguem acreditando que os juros baixos continuam, e duas céticas em relação a esse “novo normal” de juros baixos.
Não pretendemos aqui dar um veredito nem criar um Fla-Flu entre gestoras. Nossa intenção é apenas mostrar a pluralidade de visões presentes no mercado e a complexidade do tema.
Leia com atenção o que essas casa e gestores estão dizendo e tire suas conclusões.
Verde
Antes de falarmos sobre a visão da Verde Asset, um pouco de contexto: a gestora é capitaneada por Luis Stuhlberger, provavelmente o gestor mais bem-sucedido do Brasil. Seu principal fundo, o multimercado Verde, tem rentabilidade acumulada de 17.628,14% desde 1997 (ou 2.212,79% do CDI) construída em parte com uma longa posição em juros reais.
É importante ouvir o que a Verde tem a dizer:
“As dúvidas sobre a gestão fiscal dominaram o debate, e vieram para ficar. Não há saídas fáceis, e o elevado nível de endividamento que fica como herança da covid demanda prêmios de risco mais altos. Nesse contexto, as posições de juro real e inflação implícita do fundo foram zeradas, depois de longos anos”, diz a carta de agosto.
A carta de setembro, muito mais longa e didática que o normal, revela uma preocupação ainda maior e um cenário possivelmente sombrio: “Hoje, assumindo que o teto de gastos seja cumprido para frente, o resultado primário só deve voltar ao positivo em 2025, com 12 anos consecutivos de déficit primário”, diz a gestora.
“O país simplesmente não tem espaço fiscal (de déficit ou dívida) para acomodar mais gastos (…). Não é por capricho, portanto, que as reações dos preços de ativos, câmbio, juros e bolsa, são extremamente fortes quando o governo dá mostras de querer abandonar a única âncora que segura toda a sustentabilidade da dívida, que é o teto de gastos.”
Para a Verde, portanto, o “novo normal” acaba em breve.
SPX
A gestora, que tem R$ 30 bilhões sob gestão, é capitaneada por Rogério Xavier, também um dos mais celebrados do mercado e ícone maior da ‘escolinha’ BBM de gestão. Diferentemente da Verde, Xavier é um pessimista contumaz em relação ao Brasil.