O computador de 20 reais
“Nós tínhamos metas bem modestas. Mas, no nosso primeiro dia, percebemos que aquilo era um fenômeno”, conta o engenheiro inglês Eben Upton, inventor do Raspberry Pi: o computador mais barato do mundo. Ele ficou incomodado ao perceber que a Universidade de Cambridge, onde estudou, recebia cada vez menos alunos de ciência da computação.
Aí, para atrair estudantes, criou um minicomputador de US$ 35, que era versátil e fácil de programar (seu nome, que significa “Framboesa Pi”, é uma referência bem-humorada à Apple e à linguagem de programação Python). Deu mais do que certo: o Raspberry Pi se tornou um sucesso global, com mais de 10 milhões de unidades vendidas desde sua criação, em 2012. No ano passado, ele ganhou uma versão ainda mais barata: o Raspberry Pi Zero, de apenas US$ 5.
O Pi faz sucesso porque, além de ser barato, serve para muito mais coisas do que Eben previra inicialmente – há centenas de projetos, de robótica a games, baseados nele. “O meu preferido é o de balonismo”, conta. Ele se refere à iniciativa do americano Dave Akerman (daveakerman.com), que teve a ideia de colocar o Raspberry Pi em um balão meteorológico, para tirar fotos do espaço e transmiti-las via internet.
“Muitas escolas reproduziram esse projeto. Elas podem ter seu próprio programa espacial, gastando bem pouco”, diz Eben. Isso é possível porque, com a popularidade do Raspberry Pi, foram surgindo diversos acessórios para ele, de microcâmeras a sensores de poluição. O computadorzinho já foi parar até na Estação Espacial Internacional [veja nesta página alguns dos projetos mais interessantes].
Mas ele também serve para usos mais corriqueiros? Para descobrir, eu comprei um Pi Zero e o usei como computador ao longo de um mês. Consegui fazer várias coisas legais, mas também tive de aprender alguns macetes – e driblar armadilhas.
Vinte vezes vinte
O primeiro passo era comprar o Pi. Ele não é difícil de encontrar em lojas brasileiras. Mas elas só oferecem o modelo Pi 3, de US$ 35, que aqui chega por espantosos R$ 300 – o que deixa Eben bastante incomodado. “Pouca gente sabe disso, mas nós chegamos a fabricar o Pi em Manaus, em 2014, para tentar abaixar o preço”, conta. “Não conseguimos lidar com as exigências legais e tributárias, então encerramos o projeto e enviamos as placas que havíamos produzido para os EUA.”
No começo, o Pi era feito na China. Em 2013, Eben decidiu transferir a produção para o País de Gales, onde ele usa os serviços de uma fábrica da Sony. “Sai mais barato fazer lá”, diz. Eben criou uma fundação, hoje com 80 pessoas, que administra a produção e a venda do Pi. Não tem fins lucrativos, mas consegue se manter sozinha – e até sobra algum dinheiro. Qual o segredo? “Nós desenhamos a máquina e escolhemos os componentes pensando em reduzir os custos”, diz ele.
O Pi Zero pode ser encontrado em sites como eBay e MercadoLivre, onde é vendido com ágio: custa em média R$ 100. Se quisesse pagar barato, eu teria de comprar direto da Inglaterra. Entrei no site do projeto, cliquei em Shop e fui levado aos distribuidores oficiais. Uns não entregavam no Brasil. Outros cobravam US$ 30 de frete – seis vezes o preço do Pi.
Lembrei que a lei brasileira dá isenção de impostos a produtos de até US$ 50, desde que sejam enviados de pessoa física para pessoa física – e que tenho uma prima na Inglaterra. Ela comprou a plaquinha, enviou para o Brasil num envelope, e um mês depois eu estava com meu Pi Zero. Custou 5 libras esterlinas, mais 1 libra de frete: R$ 23.
Porém, para fazer ele funcionar, eu precisaria de mais algumas coisas [veja quadro abaixo]. Tentei ser o mais econômico possível: fui à rua Santa Ifigênia, polo de eletrônicos em São Paulo, procurar teclado, mouse e monitor usados. Para minha surpresa, não achei monitor de tubo em lugar nenhum, então acabei arrematando um LCD por R$ 120. Era antigo e não tinha entrada HDMI, o padrão do Raspberry Pi, então comprei um conversor.
Como o computadorzinho só tem duas entradas USB, e uma delas é ocupada pela fonte de alimentação (um carregador comum de celular), também precisei de um hub USB. Aproveitei e comprei uma antena Wi-Fi (as outras coisas, como o cartão de memória e um cabo HDMI, eu já tinha). Total: R$ 175.