Investigações apontam fazendeiros e empresários de Novo Progresso como organizadores do ‘Dia do Fogo’
Os moradores de Novo Progresso, no Pará, olham desconfiados para os lados quando questionados sobre o ‘Dia do Fogo’. “Todo ano o pessoal queima a floresta”, desconversam. Evitam falar sobre o tema já que os principais suspeitos de terem organizado as queimadas criminosas nesta parte da Amazônia, nos dias 10 e 11 de agosto, são pessoas poderosas da cidade – fazendeiros, madeireiros e empresários –, segundo investigações policiais a que a Repórter Brasil teve acesso.
Os responsáveis pelo ‘Dia do Fogo’, de acordo com investigadores das Polícia Civil e Federal, chegaram a fazer uma ‘vaquinha’ para pagar os custos do combustível – uma mistura de óleo diesel com gasolina –, usado para alastrar as chamas. Além disso, contrataram motoqueiros para entrarem nas estradas de terra próximas à floresta espalhando o líquido inflamável. A ação triplicou os focos de incêndio na região.

Um dos primeiros suspeitos ouvidos pela Polícia Civil foi Agamenon Menezes, presidente do Sindicato dos Produtores Rurais da cidade, que também foi alvo de operação de busca e apreensão da Polícia Federal nesta terça-feira (22). A operação ‘Pacto de Fogo’ apreendeu documentos na sede do sindicato, além do computador pessoal de Menezes. Os policiais cumpriram outros três mandados de busca e apreensão, mas não informaram quais foram os alvos. Além da Federal, a Polícia Civil também investiga o caso, mas a colaboração é prejudicada por brigas entre as duas corporações.
“Quem não deve não teme”, disse Menezes por telefone à Repórter Brasil após ter o seu computador apreendido, nesta terça-feira. Em outra entrevista, realizada no início de outubro quando a reportagem esteve em Novo Progresso, Menezes negou ter acontecido uma combinação entre os produtores rurais para queimar a floresta. Ele atribuiu o aumento dos focos de incêndio ao período seco.
A Polícia Civil já estava investigando o empresário Ricardo de Nadai, proprietário da loja Agropecuária Sertão. Ele teria sido o criador de um grupo de WhatsApp chamado ‘Sertão’, com 70 integrantes, onde foram combinados os detalhes sobre o ‘Dia do Fogo’.
A Repórter Brasil foi duas vezes à loja para entrevistar Nadai, mas um funcionário informou que seu patrão não queria falar. Para a polícia, o empresário negou a existência da combinação das queimadas pelo WhatsApp.

Os detalhes sobre o ataque incendiário foram costurados no grupo ‘Sertão’, mas as conversas sobre a ação começaram em outro grupo de WhatsApp, com 256 pessoas (lotação máxima permitida pelo aplicativo), chamado ‘Jornal A Voz da Verdade’. Neste grupo, estavam presentes também autoridades da região, como o delegado da Polícia Civil, Vicente Gomes, chefe da Superintendência da Polícia Civil do Tapajós, sediada em Itaituba, distante 400 quilômetros de Novo Progresso.
Foi Gomes quem determinou ao delegado de Novo Progresso o não repasse, à Polícia Federal, dos depoimentos que já haviam sido tomados pela Polícia Civil na cidade – o que piorou a relação entre as duas instituições responsáveis pela investigação.
Questionado pela Repórter Brasil, o delegado Vicente Gomes disse que não falaria nada sobre a apuração do ‘Dia do Fogo’, pois a investigação corre em sigilo por determinação judicial. Perguntado se estava no grupo de WhatsApp ‘Jornal A Voz da Verdade’, Gomes respondeu: “Não posso comentar nada”.
O acordo entre fazendeiros e madeireiros que resultou no ‘Dia do Fogo’ foi revelado em 5 de agosto pelo jornalista Adécio Piran, do site paraense Folha do Progresso. Após a publicação, Piran ficou fora da cidade por dois meses por conta das ameaças de morte que recebeu. Chegou a contar com proteção policial, mas voltou ao trabalho e dispensou a segurança. “Os responsáveis pelo fogo tornaram meu negócio inviável, já que conseguiram pressionar os comerciantes para tirarem os anúncios no meu site”, relata.