Economia

Campos Neto diz que país polarizado impôs primeiro grande teste para autonomia do BC

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, afirmou, nesta quinta-feira (17), que a autonomia da autoridade monetária, aprovada pelo Congresso Nacional em fevereiro de 2021, está atravessando seu primeiro grande teste no Brasil, com o ambiente político polarizado e a alternância de poder observada neste ano no Palácio do Planalto.

“Não é só o presidente do Banco Central que tem autonomia do Executivo. Os diretores do BC têm autonomia do presidente do BC. Você precisa, nessa trajetória, fortalecer os quadros, dar um direcionamento para que todo mundo tenha capacidade de falar e de se expressar, que tenha um debate democrático, entendendo que estamos passando pelo primeiro grande teste da autonomia. É um ambiente em que o país é polarizado, então foi um primeiro teste grande”, afirmou.

As declarações foram dadas em entrevista ao jornal digital Poder360. Durante a conversa, Campos Neto disse que a autonomia da autarquia é um processo incorporado “aos poucos, ao longo do tempo” pelas instituições e pela sociedade. “Nós vamos aprendendo a conviver com a autonomia”, disse.

“Estamos em um processo. Vamos trocando dois diretores ao ano, então vamos incorporando diretores novos, que às vezes têm vertentes de pensamentos novos e que incorporam ao debate. Mas é importante dizer que estamos amadurecendo esse processo e que nesse processo de amadurecimento temos aprendido muito. Temos aprendido muito na parte de como fazer os debates, na parte da comunicação. Temos aprendido muito sobre a importância de ter também não só a autonomia operacional, mas ter também autonomia administrativa e financeira”, pontuou.

Questionado sobre as críticas constantemente recebidas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), políticos e ministros do novo governo, Campos Neto adotou tom de naturalidade e reforçou o caráter técnico das decisões tomadas pela autoridade monetária, a despeito da pressão por cortes mais acelerados da taxa básica de juros (a Selic, atualmente a 13,25% ao ano).

“Temos um processo de polarização. Como você vem de um Banco Central em que o governo que toma posse não tem poder imediato de mudá-lo, entendo que tem uma naturalidade. Sempre dissemos desde o começo que é preciso respeitar o resultado das urnas, a eleição democrática, entrou um novo presidente, que tem às vezes opiniões sobre juros – isso faz parte do processo. O que tentamos é mostrar que as decisões foram técnicas”, disse.

“Viemos de um período em que o BC começou a subir juros 1 ano e meio antes da eleição, subiu o tempo todo, parou muito perto das eleições. Exatamente por entender que aquele era um movimento que, se a gente fizesse mais forte e mais antecipado, conseguiríamos debelar a inflação mais rápida. E aí, independentemente de quem ganhasse as eleições, o próximo mandato teria uma situação mais tranquila. Isso foi feito, o resultado está aí. Isso demonstra que, ao longo do tempo, as pessoas vão entendendo que o BC é técnico. E acho que a história vai contar a verdade no fim”, salientou.

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Durante a conversa com o jornalista Fernando Rodrigues, o presidente da autarquia disse que jamais pensou em deixar o cargo antes do fim do mandato, que vai até 31 de dezembro de 2024. “Primeiro, porque não sou eu, é o Banco Central. As decisões não são tomadas pelo presidente. Eu sou um voto de nove votos. Eu devo a todos os parlamentares que fizeram a autonomia, os ministros do STF [que ratificaram a decisão] e todos os debates que tiveram”, disse.

“E entendi sempre que, se eu fizesse isso, estaria colocando em risco um grande avanço institucional. Então, não era sobre a minha pessoa, era sobre o Banco Central e sobre o avanço institucional que foi feito com a autonomia que eu entendo que, ao longo do tempo, as pessoas vão [fazer uma] retrospectiva e dizer que isso foi uma coisa muito boa que foi feita”, prosseguiu.

Campos Neto disse, ainda, que esteve uma única vez com o presidente Lula, em um hotel em Brasília, antes de ele tomar posse. Segundo o chefe da autoridade monetária, a conversa foi “muito boa”. Ele se colocou à disposição para conversar com o petista, que tem feito críticas recorrentes ao seu trabalho, “a qualquer momento”. “Estou sempre aberto”, disse.

Erros na pandemia

Na entrevista, Campos Neto disse que o mundo, inclusive o Brasil, fez uma análise “errada” da pandemia. “Existia uma clara percepção de que estávamos diante de um cenário que seria uma depressão. As pessoas iriam ficar em casa, haveria uma total perda de mobilidade. Ninguém conseguia quantificar o que significava perda de mobilidade para o crescimento econômico”, disse.

Na avaliação do economista, as medidas de política monetária e fiscal tomadas mundo afora transformaram uma depressão em recessão ‒ movimento que mais tarde provaria uma pressão inflacionária à época subestimada por diversos países.

“Naquele período em que o Banco Central colocou a taxa de juros em 2% [ao ano] e a gente não caiu mais e fez uma coisa que chamamos de forward guidance (…), houve muita crítica de gente que achava que tinha que cair mais. Quando olhávamos a inflação esperada na frente, ela estava muito abaixo da meta. E temos uma meta de que, quando está baixa, temos que responder da mesma forma como quando está acima. A inflação futura negociada no mercado chegou a sair 1,80%. O desvio da meta naquela época para baixo foi muito maior do que foi para cima depois”, disse.

“No andar do processo de medidas de enfrentamento à pandemia, tanto monetárias quanto fiscais, aí sim, houve um erro de avaliação do que poderia ter causado colocar tanto dinheiro na economia, globalmente falando, e ao mesmo tempo com uma taxa de juros tão baixa. Existia uma interpretação de que isso seria suficiente para fazer o mundo recuperar sem causar inflação. Acho que houve um erro de diagnóstico grande”, pontuou.

Campos Neto defendeu, no entanto, a postura adotada pelo Banco Central brasileiro, que foi um dos primeiros a dar início a uma política de aperto monetário antevendo um processo inflacionário futuro e que agora colhe um índice de preços mais próximo às metas estabelecidas.

“Tudo isso somado gerou esse processo inflacionário [mundial], e aí alguns bancos centrais ainda insistiam na tese, durante algum tempo, que era um problema de oferta, e não de demanda. Isso foi muito discutido e é discutido até hoje. Nós tínhamos uma visão de que há um componente forte de demanda”, explicou.

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Fonte: Economia Infomoney
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