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‘Bolsonaro representa a maior ameaça ao planeta’, diz Sônia Guajajara

Ela está sendo manipulada. Tem uma carta do Xingu que desautoriza a Ysani a falar em nome do Xingu. Uma pessoa que é deslegitimada pela sua própria base. Fala em nome de quem? Isso já mostra a sua falta de representatividade. Ninguém é líder de si mesmo. O governo mais uma vez reforça uma prática ditatorial quando quer impor quem é o representante. Nós temos nossas formas próprias, legítimas, autônomas pra escolher nossos representantes. Se ele está dizendo que é ela, ela pode ser uma representante do governo Bolsonaro. E, se ela é representante do governo, nunca vai ter apoio dos povos indígenas que estão lutando contra essa política genocida. Com esse apoio ao governo, ela está legitimando o genocídio dos seus povos.

Na carta de um grupo de indígenas lida pelo presidente, há um comentário sobre comunidades sobrevivendo do Bolsa Família e que isso não “representa dignidade e desenvolvimento”. Como a senhora vê esse trecho?

O que falta é apoio para as iniciativas locais que já são realizadas nas comunidades indígenas. São várias as formas de produção e de geração de renda feita pelas mulheres, sem nenhum tipo de apoio. Por que o agronegócio cresce tanto? Porque é tido como o setor que alimenta os brasileiros, que aumenta o PIB, e porque há um investimento do governo, inclusive com isenção de impostos. O que falta é o governo olhar a diversidade de modos de produção e de modos de vida e de investir nessas várias formas, e não ficar no padrão único de sociedade. Quando ele diz que a gente é pobre, está olhando somente pelo lado dos bens materiais e das formas de consumo. E não olha nossa forma de viver. O que ele precisa fazer é respeitar os modos de vida e dar condições para que nossas iniciativas possam crescer e possam gerar rendas para as comunidades. Sempre pensando no uso sustentável dos territórios e dos recursos naturais, sem explorar desenfreadamente, como é a intenção deles [dos governantes]. Há hoje um tripé que é uma afronta a tudo que garante equilíbrio do clima: a mineração, o agronegócio e o desmatamento.

‘O que ele [Bolsonaro] precisa fazer é respeitar os modos de vida e dar condições para que nossas iniciativas possam crescer e possam gerar rendas para as comunidades’

O presidente da França, Emmanuel Macron, disse que a Amazônia é um bem da humanidade, outro ponto criticado por Bolsonaro no discurso, que o acusou de ter uma visão colonialista. Como a senhora avalia essa duas posições sobre a floresta? 

A Amazônia é, sim, o patrimônio da humanidade, e é responsabilidade de todo mundo protegê-la. Quando ele [Bolsonaro] critica o cacique Raoni, por exemplo, dizendo que ele não representa os índios, ele se contradiz. O Raoni tem autoridade para falar em nome dos povos, tem uma história de luta pelos povos da Amazônia, dedicou sua vida inteira ao meio ambiente e aos povos indígenas do Brasil. Não vamos aceitar que o governo diga quem é a liderança indígena do Brasil. 

Nesta terça-feira (24) o Cimi (Conselho Indigenista Missionário) divulgou um relatório mostrando aumento de assassinatos e aumento de invasões de terras indígenas. Qual a responsabilidade do governo Bolsonaro nessa escalada de violência?

Desde a campanha, o Bolsonaro já tinha esse discurso de ódio, que autoriza invasões a territórios indígenas. Com essa política do governo de armamento, esse discurso de que não haverá território demarcado, essa visão do integracionismo, tudo isso respalda forças reacionárias e legitima forças contrárias aos direitos indígenas e ambientais. Todos que querem praticar invasões e ataques se sentem autorizados. Não temos dúvidas de que o aumento da violência está muito ligado ao desmatamento e à impunidade, medidas respaldadas por esse discurso do governo. Bolsonaro é o culpado pelo aumento desses assassinatos e aumento desses conflitos.

‘Não vamos aceitar que o governo diga quem é a liderança indígena do Brasil’

A senhora sempre faz um pedido de que a sociedade se aproxime e ouça as demandas dos povos indígenas. Como é possível fazer isso?

O mundo está muito acelerado, tem muita pressa, e quanto mais a gente tem pressa, mais nós estamos atendendo a essa demanda do capitalismo. Quanto mais você atende à demanda do capitalismo, mais você está sendo conivente com a exploração. As pessoas precisam parar e respirar e entender qual é a urgência do momento. Estamos falando do aquecimento global, estamos falando de reduzir as mudanças climáticas. Mas não estamos conseguindo mudar posturas. Enquanto a gente não conseguir mudar nosso ritmo, a gente não vai conseguir desacelerar essa pressão. 

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