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Governadores renovam isenção de R$ 6 bi para agrotóxicos em meio à crise

Em meio a uma pandemia que gera demandas econômicas urgentes para os cofres públicos, governadores de todo o país decidiram prorrogar uma isenção fiscal que beneficia a venda de agrotóxicos. O acordo permite a desoneração de 30% a 60% do ICMS nas comercializações interestaduais de pesticidas e outros insumos agropecuários, o que significa que os governos estaduais deixam de arrecadar – e as empresas deixaram de pagar – mais de R$ 6,2 bilhões por ano, de acordo com estudo da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco).

Com esse valor, os estados poderiam comprar mais de 90 mil respiradores mecânicos, no valor de US$ 13 mil cada, como os que o Ministério da Saúde comprou no começo do mês. Ou, caso decidissem  investir em testes rápidos, poderiam adquirir mais de 82 milhões de testes, no valor de R$ 75 cada.

O Mato Grosso foi o que mais deixou de arrecadar, mais de R$ 1,3 bilhão em 2017. Seguidos por São Paulo, com R$ 953 milhões, e Rio Grande do Sul, com R$ 945 milhões

A decisão de prorrogar o benefício até o final de 2020 foi publicada na edição de ontem (23 de abril) do Diário Oficial da União. Para ser renovada, a medida precisava ser aprovada por unanimidade entre todos os secretários de Fazenda dos 26 Estados e do Distrito Federal, o que ocorreu. A isenção é regulada por um convênio construído dentro do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).

O desconto do ICMS é o principal item da “bolsa agrotóxico”, um pacote de benefícios que o agronegócio recebe do governo e que conta ainda com desonerações no PisPasep/Cofins, IPI e Imposto de Importação. Somadas, as isenções aos pesticidas superaram R$ 10 bilhões apenas em 2017, de acordo com o estudo da Abrasco feito com base nos dados do censo agropecuário, da Secretaria de Comércio Exterior (Secex), Receita Federal e da legislação tributária federal e estadual. 

A decisão foi tomada, ainda, sem o embasamento técnico necessário. Toda vez que os estados se reúnem para votar essa questão, um grupo técnico apresenta um estudo para avaliar se o convênio está realmente produzindo o efeito esperado. Esse trabalho é apresentado para os secretários de Fazenda antes da decisão ser tomada, coisa que não ocorreu esse ano. “Prorrogamos o convênio apenas por oito meses, por uma questão emergencial. A reunião que faria o estudo técnico foi suspensa devido ao momento que estamos vivendo”, diz Bruno Negris, diretor do Confaz.

Vigésima prorrogação em 23 anos 

Essa foi a vigésima vez que a isenção foi prorrogada. Há 23 anos em vigor, entra e sai governo e o benefício bilionário aos produtos agrotóxicos nunca foi derrubado.  Segundo Negris, isso ocorre porque os governadores estão preocupados com o aspecto econômico, já que a maior justificativa da isenção é incentivar a produção agrícola. “O setor agrícola está presente em todos os estados. A visão foi sempre mais econômica, na busca por geração de emprego e segurar o homem no campo”, afirma.

“Não há outra explicação a não ser a grande pressão e lobby do agronegócio”, discorda a advogada Naiara Bittencourt, da ONG Terra de Direitos, que vem acompanhando os debates sobre as isenções de impostos para agrotóxicos. “As federações estaduais e federais e grandes organizações do agronegócio acompanham esses debates, estão monitorando”, argumenta.

É o caso da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), que propôs a renovação ao Confaz juntamente com as federações estaduais de agricultura, associações e organizações do setor. “A CNA solicitou a proposta para garantir que os insumos agropecuários cheguem aos produtores rurais com preços competitivos. Assim, os produtores rurais podem garantir a continuidade da produção de alimentos e abastecimento da população”, diz a nota publicada no site da confederação.

Santa Catarina ameaçou cortar benefício, mas recuou

Pela primeira vez no ano passado, um secretário de Fazenda declarou que iria votar contra a renovação do benefício: Paulo Eli, secretário de Fazenda de Santa Catarina. “Ano que vem será o ano da retirada nacional da isenção do agrotóxico, pois Santa Catarina vai votar contra no Confaz na prorrogação desses benefícios. Já é uma decisão tomada, então, a partir de 1º de maio do ano que vem, agrotóxico no país vai pagar imposto e isso vale para todos”, discursou o Secretário em audiência na assembleia legislativa estadual em junho do ano passado.

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