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MP da ‘Liberdade Econômica’ retira direitos, enfraquece fiscalização e facilita descumprimento da lei trabalhista

A MP também propõe uma disputa entre os órgãos do poder público para a assinatura de acordos com empresas infratoras, o que limita o poder do MPT de propor Termos de Ajuste de Conduta (TACs).

Tramitação sem debate

Organizações ouvidas pela reportagem criticam a forma como as alterações na Legislação estão sendo propostas: acrescentadas ao texto de uma medida provisória, sem debate com a sociedade e de forma paralela às discussões da reforma da Previdência.

Caso a medida provisória seja aprovada pelo Congresso, trabalhadores rurais poderão ficar sem folgas no período de safra (Foto: Verena Glass/Repórter Brasil)

Entidades que acompanham a tramitação relataram dificuldades para analisar o que deve ser votado hoje pela Câmara, dadas as idas e vindas na redação da MP, que tramita de maneira célere e confusa no Congresso. O deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) apresentou a primeira versão oficial do relatório dois dias antes da votação pela comissão especial mista, triplicando o texto enviado pelo Executivo. Horas antes da aprovação, o relatório foi reapresentado com mudanças substanciais. Na última sexta-feira (9), após conversa com parlamentares, surgiu uma terceira versão, mais enxuta, que está passando por um pente-fino antes de ir a plenário e pode ter novas alterações. Caso seja aprovado hoje pelos deputados, o projeto precisará ser votado até o dia 27 no Senado para virar lei. 

Além da rapidez da tramitação, o procurador Márcio de Andrade vê uma “desarmonia dos poderes da República” na discussão da MP, com a prevalência das posições do Executivo sobre as vontades do Parlamento. “Conversei com parlamentares e eles disseram ‘eu queria tirar isso, mas é um pedido do ministério da Economia’. Esse discurso a gente não pode comprar.”

“Pela complexidade desta MP, ela tem que ser bem discutida. Isso é uma postura autoritária do governo e do Congresso, de fazer o debate com pressa. Qual a urgência? Estão tentando passar com rolo compressor coisas de que a sociedade nem tomou consciência”, critica Aristides Santos, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag).

Procurado pela Repórter Brasil, o relator do projeto na comissão, Jerônimo Goergen (PP-RS), nega que a MP tenha passado pela comissão especial sem debate. “Isso não é verdade. Foram apresentadas 301 emendas, e só isso já demonstra o envolvimento dos parlamentares. Tivemos emendas de todos os partidos acolhidas”. Segundo o deputado, e os procedimentos de tramitação e os prazos foram acordados com todos os membros da comissão, incluindo a oposição.

Sobre a retirada de poder dos auditores fiscais, o deputado considera um procedimento de desburocratização. “Estamos transformando o Estado em educativo, e não em punitivo e arrecadatório como é hoje. A retirada de poder dos auditores fiscais é para dar confiança ao empresário brasileiro, que hoje não tem.” 

O Ministério da Economia afirmou que se pronunciará após a aprovação da medida. 

Confira, abaixo, as principais mudanças propostas pela medida provisória relacionadas à questão trabalhista:

1. Empregado poderá trabalhar aos domingos sem pagamento em dobro

Uma das principais mudanças introduzidas pela medida provisória é a liberação do trabalho aos domingos e feriados para todas as categorias. O texto permite, inclusive, que professores possam dar aulas nesses dias. O projeto em tramitação continua garantindo que o trabalhador terá direito a uma folga semanal, mas ela só precisará coincidir com o domingo uma vez a cada sete semanas. Ao conceder descanso em outro dia, o empregador ficará dispensado do pagamento em dobro pelo domingo trabalhado. Na prática, trabalhar ao domingo não trará nenhum benefício para o trabalhador, nem financeiro. 

Atualmente, a CLT diz que a folga semanal dos trabalhadores precisa coincidir com o domingo, exceto quando houver necessidade – caso do setor de transportes, hospitais ou restaurantes, por exemplo. A MP 881 acaba com a ideia de que o trabalho aos domingos e feriados seja uma exceção. A folga nesses dias garante a vida comunitária, permitindo o convívio entre pais e filhos, o lazer e a participação em atividades sociais ou religiosas. 

“Se uma das metas do governo é proteger o instituto da família, isso está completamente na contramão. Com quem as crianças vão ficar no final de semana? Quando o marido vai ver a esposa se o domingo de folga deles não coincidir?”, questiona o procurador do trabalho Márcio de Andrade.

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