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Mesmo após ‘Dia do Fogo’, madeireiros seguem destruindo Amazônia e ameaçando assentados

Dill já foi multado duas vezes por desmatamento ilegal na região de Novo Progresso. Em um dos episódios, recebeu multa de R$ 288 mil do Ibama. Seu irmão, Evandro Carlos Dill, também foi multado por extração ilegal de madeira dentro da Flona Jamanxim. Os dois atuavam como madeireiros e tinham uma serraria em Novo Progresso, segundo entrevista de Dill à Repórter Brasil, em que se queixou do fechamento dessa madeireira após a criação da Flona do Jamanxim, em 2006. 

Sucessão de assassinatos

Maria Márcia vive com a sensação de que vai ser assassinada a qualquer momento por conta das ameaças e das denúncias que faz. A violência se intensificou no assentamento no último ano, quando outra liderança do assentamento foi morta. Quem exigiu a punição dos responsáveis também foi assassinado. 

Segundo Maria Márcia, além de Dill, outras três pessoas influentes de Novo Progresso a ameaçam: o presidente do sindicato dos trabalhadores na agricultura familiar (Sintraf) de Novo Progresso, Raimundo Barros Cardoso (conhecido como Dico); o chefe do departamento de Regularização Fundiária da prefeitura, Roberto Aparecido de Passos e o fazendeiro Messias Floriano Ferreira. 

Um das lideranças dos trabalhadores rurais da região, Maria Márcia sofre ameaças desde que outros dois líderes foram assassinadas (Foto: Fernando Martinho/Repórter Brasil)

Os três foram presos em 10 de outubro, mais de um ano após o desaparecimento de Antônio Rodrigues dos Santos, o Bigode. Ex-liderança do Terra Nossa, Bigode desapareceu quando denunciava extração ilegal de madeira dentro de seu lote. Roberto e Messias já foram libertados e apenas Dico permanece preso. Os três são investigados pela morte de Bigode.

Dill afirma que nunca ameaçou Maria Márcia. “Ela inventou isso para me prejudicar politicamente”, diz. O vice-prefeito  registrou uma queixa acusando Márcia de calúnia. Os advogados de Messias e Roberto disseram que eles não tiveram participação na morte de Bigode e que não têm conhecimento das ameaças. A reportagem enviou as perguntas para o advogado de Raimundo, mas não obteve respostas.  

Após o assassinato de Bigode, o presidente de outro Sintraf – o de Castelo dos Sonhos-, Aluísio Sampaio (conhecido como Alenquer), passou a exigir publicamente a investigação do crime. Também foi assassinado. Antes de morrer, gravou um vídeo denunciando os responsáveis pelas ameaças que sofria – , dentre eles, o Dico, que há onze anos foi indiciado pela morte de outra uma liderança rural de Marabá. 

O PDS Terra Nossa tem o mesmo tamanho da cidade de São Paulo e, além dos assentados, há 76 fazendas ilegais  (fruto de grilagem de terra). Os fazendeiros pressionam o Incra e os pequenos produtores para que aconteça uma redução na área do assentamento e uma regularização de um número maior de grandes propriedades. 

Floresta sob pressão 

A pressão que ocorre no PDS é corriqueira na região. A Floresta do Jamanxim é dominada por conflitos agrários, grilagem de terras, garimpos e extração de madeira ilegal desde que área de proteção ambiental foi criada, em 2006, pela então ministra do Meio Ambiente Marina Silva. Produtores rurais argumentam que a Flona do Jamanxim foi estabelecida em áreas que já estavam sendo exploradas comercialmente com criação de gado e extração de madeira.

“Criaram a Flona do Jamanxim, em 2006, onde nós já trabalhávamos e passamos a ficar na ilegalidade de um dia para o outro”, reclama o vice-prefeito em entrevista à Repórter Brasil. O ICMBio, entretanto, estima que 67% dos ocupantes da Flona entraram pouco antes ou logo após a criação da área.

Atingida pelo ‘Dia do Fogo’, Floresta Nacional do Jamanxim é a terceira área de proteção mais desmatada da Amazônia, segundo o Inpe (Foto: Fernando Martinho/Repórter Brasil)

Com área equivalente à da Irlanda do Norte (1,3 milhão de hectares), a Flona está sob pressão não apenas dos produtores locais, mas também de políticos ligados à bancada ruralista, que articularam durante o governo de Michel Temer uma redução da área protegida. Depois de pressão de ambientalistas e de uma campanha que contou com a participação de celebridades como a modelo Gisele Bündchen, Temer vetou a medida. 

Após o veto, o Planalto tentou reduzir novamente a Flona, desta vez por meio de um projeto de lei enviado ao Congresso. Foi um aceno à bancada ruralista, já que o então presidente precisava dos votos desses parlamentares para se livrar de pedidos de impeachment (feitos após escândalo envolvendo os irmãos Wesley e Joesley Batista, da JBS). O projeto aguarda a criação de uma comissão temporária para analisar a proposta. 

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